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Não existe mais obra final
A tecnologia virou uma ótima muleta para consertar erros de obras já consumidas pelo público.
Quando assistimos um filme no cinema, temos a impressão de que estamos vendo a versão final do que foi definido como o ideal pela produção da obra. Mas não é raro que alguém mexa na versão final.
Quando Star Wars foi lançado (1977), era só um filme. Depois que a sequência saiu, e o primeiro filme voltou aos cinemas (1981) ganhou uma alteração logo na abertura. Passou a incluir "Episode IV: A New Hope".
E não foi só isso. No relançamento em 1997, foram feitos vários ajustes nos efeitos especiais e ainda colocaram o Greedo atirando antes do Han Solo, que o herói só tivesse revidado.
E não foi só o George Lucas que alterou filmes prontos. A famosa "Versão do Diretor” já mexeu em muitos filmes, tentando melhorar o que tinha ido pro cinema com muita interferência dos produtores.
O Blade Runner (1982) só passou a ser mais reconhecido como um grande filme depois da versão que tinha mais a cara do Ridley Scott, lançada 10 anos depois.
Nessas épocas os filmes eram distribuídos em rolos e não tinha como mexer com velocidade nas versões que chegavam aos cinemas. Era mais em relançamentos mesmo. Que podiam ser desde ajustes técnicos (muitas remixagens) até mudanças mais profundas na estrutura do filme, como no caso de Blade Runner.
Hoje em dia ficou muito mais fácil fazer qualquer modificação. Com os streamings, é só fazer o ajuste nas cópias dos servidores que todo mundo só vai ter acesso ao que estiver mais atualizado.
Pode ser para corrigir um pequeno erro, como o cara de calça jeans em The Mandalorian. O seriado saiu com um penetra no fundo de uma das cenas que acabou sendo digitalmente apagado e o arquivo atualizado.
Mas não é só no streaming que ficou fácil fazer alterações.
Hoje a distribuição de filmes para os cinemas também é digital. Então é possível atualizar a cópia de uma obra
sem precisar esperar chegarem rolos com o filme.
Quando saiu o Homem-Aranha no Aranhaverso, muitos fãs reclamaram que o som estava muito baixo em uma cena. O roteirista e produtor Phil Lord pediu para que quem fosse novamente aos cinemas pedisse para as salas de exibições colocarem no volume 7 ou 7.5.
#SpiderVerse friends! if you get to the theater early and you want a fun mission ask someone to check that the theater volume is set at reference (7)! If it sounds a bit quiet, invite them to turn it up a touch to 7.5! If they give you flack... tell them we said it was okay.
— Phil Lord (@philiplord)
8:55 PM • Jun 2, 2023
Mas essa não era uma boa maneira de resolver o problema. Aí a Sony atualizou as cópias e todos os cinemas receberam uma versão com o som ajustado. Algo impossível na época da película.
É ótimo poder ter os problemas resolvidos com essa facilidade. Mas também é estranho pensar que sem cópias físicas vamos perder versões de obras, como o Han Solo atirando primeiro. Só teremos acesso ao que os estúdios considerarem o ideal pro momento.
Sem querer parecer o alarmista aqui, mas lá no fundo bate um medo de começar a ir pra um lado meio 1984 onde podem mudar o passado de tudo e ninguém vai nem lembrar como era.
Vai caber aos piratas terem as cópias originais e manter a história como ela era.